A Procuradoria Geral do Estado (PGE), órgão que reúne uma enorme banca de advogados concursados para defender o Estado na Justiça, ignorou as descobertas da Polícia Federal reveladas na Operação Éris, de falsidade dos ofícios apresentados pela antiga cúpula da SSP (Secretaria da Segurança Pública) para convencer a Justiça de que a remoção de 126 delegados, incluindo os quatro delegados que investigavam corrupção tinham fundamentação, e apelou ao Tribunal de Justiça para derrubar a sentença de agosto deste ano que anula essas remoções feitas em novembro de 2019.Assinado pelo procurador do Estado Thiago Emanoel Azevedo de Oliveira, o recurso de Apelação, com 11 páginas, tem data de protocolo no dia 27 de outubro, ou seja, uma semana após a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que afastou o governador Mauro Carlesse e a cúpula da SSP escancarou as manobras realizadas pela antiga gestão para aparelhar a pasta. Segundo o procurador, a documentação que a SSP juntou no processo demonstraria que a realocação dos delegados “foi devidamente motivada e houve a justificativa correta, visando o interesse público e na impessoalidade, originados a partir das respectivas chefias imediatas e acolhidos pelo Delegado-Geral, corroborados pelo Senhor Secretário de Segurança Pública”. O procurador Oliveira prossegue apontando que havia necessidades “identificadas” pela cúpula incluindo “a criação e extinção de delegacias decorrentes da implementação do regime interno” criado no governo Carlesse.Em outro argumento, o procurador afirma que o Poder Judiciário não pode invadir o espaço da livre escolha do executivo (discricionariedade da administração) porque competiria ao “comando superior a distribuição equitativa e correta dos policiais em todo o Estado, com base em dados estratégicos e técnicos”. Porém, na operação Éris, a PF imputa à cúpula da SSP afastada o crime de falsidade ideológica, isto é, de falsificar diversos ofícios, com data retroativa, numa tentativa de demonstrar que teria havido movimentação interna para designar delegados em funções comissionadas, antes da publicação dos atos, no dia 6 de novembro daquele ano. Quando recorreu ao Tribunal de Justiça, o governo apresentou entre seus argumentos os ofícios de n° 123/2019 — DRACCO/SSPTO, de n° 310/2019 — DPC/SSPTO, de n° 156/2019 — DPI/SSPTO e o ofício de n° 504/2019 — GAB/DGPC/SSPTO com pedidos de remoção e as listas com nome dos delegados afetados. A PF analisou o sistema de tramitação de documentos do Executivo e concluiu que ofícios com esse teor só foram produzidos pela administração da SSP a partir do dia 13 de novembro, data em que o juiz Roniclay Alves de Morais suspendeu, por liminar, todas as remoções, com o fundamento de desvio de finalidade dos atos do governo.Para a PF, o secretário de Segurança Pública, Cristiano Barbosa Sampaio, "com plena consciência de que inexistiam fundamentos para os atos, determinou à Delegada-Geral da Polícia Civil, Raimunda Bezerra de Souza, que providenciasse fundamentação, o que foi feito por meio de produção com falsidade ideológica dos ofícios" que foram acolhidos pelo Tribunal de Justiça (TJTO) para suspender a liminar que determinava a volta dos delegados.A PF também mostra que os diversos ofícios e reuniões sugeridas pela cúpula para a escolha dos 126 delegados que seriam removidos teria de ter ocorrido, obrigatoriamente entre o dia 6 novembro às 1h41m23s, data da divulgação do Diário Ofício com a Medida Provisória n° 18, de 5 de novembro de 2019, que criava 177 funções comissionadas na SSP e o dia 6 de novembro de 2019, às 23h44m32s, momento em que foi divulgado outro Diário Oficial com as designações de funções comissionadas.Uma escrivã da Civil é uma das principais testemunhas da falsificação, segundo a PF. Em depoimento aos investigadores, uma das ex-assessoras da ex-diretora-geral da Polícia Civil, Raimunda Bezerra, confessou a falsificação àPolícia FederalDe acordo com o depoimento, o ex-assessor de Normas e Legislação da Delegacia-Geral, e o ex-chefe da assessoria jurídica da SSP “atuaram diretamente na produção dos ofícios ideologicamente falsos no dia 13/11/19”. Para a PF, o depoimento deixa “ainda mais explícita a participação do Secretário de Segurança Pública e da Diretora-geral da Polícia Civil no episódio”, de falsificação dos ofícios. O recurso de apelação ainda não tem registrada no E-Proc para qual gabinete houve a distribuição, o que não permite, ainda, saber quem será o relator no Tribunal de Justiça.