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Salatiel Soares Correia

Salatiel Soares Correia

É engenheiro, administrador de empresas, mestre em Ciência pela Unicamp. É autor do livro A Energia na Região do Agronegócio

A cidade onde a felicidade é uma ilusão

Salatiel Soares Correia

Lá eu e minha esposa tomamos o melhor café da manhã de nossas vidas. Como sou uma pessoa que aprecia enxergar os detalhes para explicar o todo, fiz questão de contar algumas guloseimas daquele café manhã que mantenho vivo no meu paladar há uns vinte anos. Cem variedade de bolos, 53 tipos de pães, frutas oriundas de vários países. 32 variedades de chá, 52 tipos de suco, e por vai. Tudo aquilo tenha um só: alimentar os 5000 hospedes que se hospedavam, naquele imenso hotel de 5300 leitos. Os 40 milhões de turistas tem a disposição deles, naquela cidade que nunca dorme, uma extraordinária infraesestrura a sua inteira disposição.

Aquela metrópole atrai, para o consumo sem fim, milhões de turistas do mundo inteiro dispostos a gastar, gastar e gastar. Atender aos milhões de pessoas que apreciam o jogo em esplendores cassinos, estrategicamente colocados nos mega hotéis na cidade. Nos mais luxuosos, a 13 mil dólares a diária ,os hotéis colocam a disposição jatos que vão buscar os ilustres milionários em seus países para fazer o que muitos deles não podem realizar em seus países :jogar.

Os bilionários da Arabia Saudita e do mundo árabe em geral, preferem ir para essa cidade dos sonhos, nos seus mega jatos adaptados com quartos,banheiros,salas de reuniões e por aí vai. para servir a exigente a exigente clientela os hotéis dispõem de tudo que o conforto do dinheiro pode pagar.

"Esses milionários gastam fortunas nessa cidade que nunca dorme. Mais perdem do que ganha. "A história dessa cidade foi feita mais por perdedores que ganhadores" Assim, disse-me um dos gerentes do hotel onde fiquei hospedado. Tudo naquela cidade é extraordinariamente grandioso. Veja-se o caso do setor de entretenimento. A preocupação passa sobretudo em colocar cada dia da semana grandes titãs do entretenimento mundial --- sejam eles,cantores,cantoras,artistas de circo --, quanto a isso, apresentado abaixo o nome das 5 personalidades do show bussinnes mundial que se apresentaram na semana que eu lá estive.

Segunda-feira, o tenor Plácido Dominguez, terça feira, Elton Jonh; quarta-feira ,a banda inglesa Cold Play; Quinta-feira , Paul Mac Carteney com Ringo Star dando uma canja; Sexta-feira, Lady Gaga; Sábado, o grande Guitarrista Eric Clapton e Domingo a casa fecha porque ninguém é de ferro.

Essa cidade existem os casamentos de mentira. Nas inúmeras igrejas existentes na capital mundial do jogo você pode se casar com muita facilidade pelos motivos mais torpes: para legalizar essas uniões existem milhares igrejas inclusive dentro dos hotéis .Nelas, os turistas muito bem se casar ou descasar, com muito facilidade, nessa cidade que nunca dorme. A cidade de que vos falo é Las Vegas nos Estados Unidos.

Para explicar a impressão que me deu essa megalópole, recorro ao grande Machado de Assis que diz num de seus contos que o homem tem duas almas---a interior e a exterior. No exterior se encontra a superficialidade humana contida no sexo sem amor, nas plásticas que fazemos para lutar contra o tempo, no jogo, na bebida, enfim: a alma exterior expressa tudo aquilo que nos dá prazer; na alma interior encontramos, o sexo com amor, num livro que nos toca, numa música que nos emociona.

Dito isso concluo: Las Vegas é uma metrópole feita sob medida para atender os desejos da alma exterior. Tive a impressão de que Las Vegas é uma cidade onde a felicidade é uma ilusão. O vazio existente dentro de nós mesmos permanecerá sem serem verdadeiramente preenchidos. Continuaremos,assim, depois de termos conhecido a capital do jogo nos Estados Unidos continuaremos imersos nas dúvidas do ser ou não ser preso nos fantasmas shakespearianos que alma exterior foi incapaz de enfrentar.

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Escola em Tempo Integral: repensando um modelo que precisa evoluir

Luciano Silva Gomes Milhomem é Major da Polícia Militar do Estado de Tocantins

Luciano Silva Gomes Milhomem é Major da Polícia Militar do Estado de Tocantins (Arquivo Pessoal)

A implementação das escolas de tempo integral no Brasil tem sido amplamente defendida como uma solução para melhorar o desempenho dos alunos, reduzir a evasão escolar e oferecer mais oportunidades de aprendizado. No entanto, apesar das boas intenções por trás desse modelo, sua aplicação tem revelado falhas estruturais e pedagógicas que precisam ser debatidas.

Atualmente, o tempo integral vem sendo adotado de maneira quase padronizada, sem considerar as particularidades regionais, as necessidades dos alunos e as condições das escolas. Em muitos casos, ele acaba se tornando mais um modelo pensado para atender às demandas das famílias do que, de fato, para aprimorar a educação. Os pais enxergam a escola como um espaço seguro para deixar seus filhos durante o dia inteiro, enquanto trabalham. No entanto, essa permanência prolongada pode ser prejudicial para diversos estudantes, principalmente aqueles com dificuldades de aprendizagem ou que necessitam de acompanhamento específico.

Um dos maiores desafios desse modelo é o impacto negativo na formação pedagógica dos alunos. Para estudantes neurodivergentes, como aqueles com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), passar tantas horas dentro da sala de aula pode ser um fator de estresse e desmotivação. O ideal para esses alunos seria um sistema mais flexível, no qual frequentassem as disciplinas curriculares durante a manhã e, no contraturno, tivessem acesso a atividades extracurriculares e a um acompanhamento psicopedagógico especializado.

Além disso, o tempo integral, da maneira como vem sendo aplicado, dificulta a realização de aulas de reforço para alunos que apresentam dificuldades no aprendizado. Não se trata apenas de mais tempo na escola, mas sim de tempo bem aproveitado. Hoje, muitas escolas recebem estudantes que chegam a segunda etapa do ensino fundamental sem saber ler ou escrever corretamente. No Colégio Militar do Estado de Tocantins -- Unidade 1, onde sou diretor, recebemos recentemente 11 alunos que não foram alfabetizados. Antes, já enfrentávamos o desafio de trabalhar com analfabetos funcionais, estudantes que ao menos sabiam escrever o próprio nome. Agora, no entanto, há alunos que sequer conseguem fazer isso. Isso evidencia um problema ainda mais profundo: a necessidade urgente de um trabalho de qualidade na educação das séries iniciais, responsabilidade dos municípios. Se o ensino básico não for eficiente, toda a estrutura da educação será comprometida nos anos seguintes.

Outro ponto crítico é a falta de estrutura das escolas para funcionar em tempo integral. Muitas unidades foram projetadas para funcionar apenas em meio período e agora enfrentam problemas de infraestrutura, alimentação e climatização. No meu colégio, por exemplo, a climatização das salas é insuficiente devido às instalações elétricas antigas, e os aparelhos de ar-condicionado frequentemente desligam por sobrecarga. Em um estado quente como o Tocantins, isso torna o ambiente de aprendizagem extremamente desconfortável. Como exigir que um estudante mantenha a atenção e o rendimento em uma sala abafada, durante um período estendido?

A situação dos profissionais da educação também é preocupante. A ampliação da carga horária dos coordenadores de área em sala de aula prejudicou o acompanhamento pedagógico da escola. Antes, esses profissionais podiam se dedicar ao planejamento educacional, ao apoio aos professores e ao desenvolvimento de estratégias pedagógicas. Agora, com mais horas de aula obrigatórias, sua atuação estratégica foi enfraquecida, impactando diretamente a qualidade do ensino e gerando sobrecarga nos coordenadores pedagógicos e nos servidores da Equipe Multiprofissional.

Outro aspecto essencial que não pode ser ignorado é a falta de incentivos financeiros para os profissionais que atuam nesse modelo. A educação em tempo integral exige uma dedicação muito maior dos professores e demais servidores da escola. Muitos passam o dia inteiro na instituição, sem sequer retornar para casa para fazer suas refeições. Além do desgaste físico e mental, essa carga de trabalho intensa não é compensada com gratificações ou incentivos financeiros adequados. O governo federal precisa direcionar mais verbas para fomentar essas atividades dentro das escolas de tempo integral, garantindo melhores condições de trabalho e remuneração diferenciada para os profissionais que se dedicam integralmente à educação desses alunos. Sem esse investimento, o modelo de tempo integral se torna insustentável a longo prazo.

Além dos problemas estruturais e pedagógicos, há ainda uma questão que reflete a mentalidade equivocada sobre a educação: a falta de envolvimento de muitos pais na formação dos filhos. Recentemente, no Colégio Militar do Tocantins - Unidade 1, adotamos a prática de enviar notificações aos responsáveis, via WhatsApp, sempre que um aluno deixava de realizar suas atividades em sala. O objetivo era claro: manter os pais informados e incentivá-los a acompanhar a vida escolar de seus filhos. A reação de muitos foi, no mínimo, alarmante. Vários responsáveis reclamaram que estavam sendo "incomodados" e se sentiram "constrangidos" por receber essas mensagens.

Isso demonstra um problema ainda mais grave: a falta de compromisso de algumas famílias com a educação dos filhos. Como pode um pai ou mãe se sentir incomodado por ser informado de que o filho não está cumprindo suas obrigações escolares? Esse tipo de postura apenas reforça a tese de que, para muitos, a escola de tempo integral se tornou um "depósito de crianças", onde a responsabilidade pelo aprendizado recai inteiramente sobre os professores e servidores da educação. Mas educação não funciona assim. A escola tem um papel essencial, mas a formação educacional é uma responsabilidade compartilhada entre a escola e a família. Se um desses pilares falha, todo o sistema entra em colapso.

Diante desses desafios, proponho uma reformulação do modelo de tempo integral. Em vez de manter os alunos presos em um currículo rígido ao longo de todo o dia, as escolas deveriam adotar um formato mais dinâmico. As disciplinas curriculares poderiam ser concentradas no período da manhã, enquanto a parte da tarde seria dedicada a atividades extracurriculares como dança, teatro, práticas esportivas, xadrez, música, além de outras atividades que estimulem o desenvolvimento dos alunos. Além disso, o contraturno deveria ser utilizado para aulas de reforço e para um acompanhamento especializado dos alunos com dificuldades de aprendizagem. O Estado, por sua vez, precisa garantir a contratação de profissionais como psicopedagogos, que possam atender alunos com necessidades específicas, e professores focados na alfabetização de estudantes que ainda não dominam habilidades básicas.

O governo federal também deve repensar a destinação de verbas para essas escolas, assegurando um financiamento que permita não apenas a manutenção da infraestrutura e das atividades extracurriculares, mas também o pagamento de gratificações aos profissionais da educação. A valorização dos professores e servidores é um fator essencial para o sucesso do ensino integral, pois são esses profissionais que fazem o modelo funcionar na prática. Sem incentivos, o risco é que o tempo integral acabe sendo apenas uma carga horária excessiva, sem o retorno esperado na qualidade do aprendizado.

A escola de tempo integral pode ser uma ferramenta poderosa para transformar a educação, mas apenas se for implementada de forma inteligente e adaptada às reais necessidades dos alunos. Sem estrutura, sem planejamento pedagógico adequado, sem incentivos aos profissionais e sem o envolvimento das famílias, esse modelo pode acabar fazendo mais mal do que bem. Educação de qualidade não se faz apenas com carga horária ampliada, mas com estratégias eficazes e com o compromisso de todos os envolvidos.

Luciano Silva Gomes Milhomem é Major da Polícia Militar do Estado de Tocantins e atualmente, diretor do Colégio Militar do Estado de Tocantins -- Unidade 1. É bacharel em direito, especialista em ensino de comunicação e mestre em comunicação e sociedade pela Universidade Federal do Tocantins.

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Entre arte e memória -- Um passeio pela vida de Calouste Gulbenkian

Salatiel Soares Correia é engenheiro, administrador de empresas, mestre em Ciência pela Unicamp

Salatiel Soares Correia é engenheiro, administrador de empresas, mestre em Ciência pela Unicamp (Arquivo pessoal)

A brisa fresca de Lisboa acaricia o rosto do turista, que, com um mapa na mão e olhos curiosos, atravessa a imponente entrada da Fundação Calouste Gulbenkian. Porém, para compreender plenamente esse espaço, é preciso voltar no tempo e explorar a fascinante trajetória de seu criador: um magnata do petróleo, um estrategista nato e um homem cuja vida pessoal foi marcada por jogos de sedução e segredos bem guardados.

O magnata e sua ascensão

Calouste Sarkis Gulbenkian nasceu em 1869, em Scutari, no Império Otomano. Descendente de uma influente família armênia, desde jovem, demonstrou uma inteligência aguçada para os negócios e compreensão sofisticada da política internacional. Educado em Paris e Londres, sua formação em engenharia não tardou a ser eclipsada por suas habilidades de negociação e seu faro apurado para oportunidades financeiras.

O Oriente Médio, no início do século XX, era um tabuleiro de xadrez geopolítico. A disputa por campos petrolíferos envolvia potências europeias, impérios decadentes e empresas ambiciosas. Foi nesse cenário que Gulbenkian, com sua postura diplomática e conexões privilegiadas, conseguiu intermediar acordos entre grandes potências, tornando-se uma figura indispensável na exploração de petróleo. Seu talento para a negociação lhe rendeu o apelido de "Senhor 5%", uma referência à participação que ele mantinha nos principais consórcios petrolíferos, como a Royal Dutch Shell.

Ao longo das décadas, Gulbenkian consolidou um império financeiro, assim, criando uma rede de influência que transcendia fronteiras. Sua capacidade de antecipar movimentos e posicionar-se estrategicamente tornava-o não apenas um grande investidor, mas também um jogador discreto no tabuleiro político mundial.

O homem por trás da fortuna

Se, nos negócios, Gulbenkian se destacava por sua prudência e diplomacia, na vida pessoal, ele demonstrava a mesma habilidade para envolver-se em relações amorosas que desafiavam convenções. Casado com Nevarte Essayan, uma mulher de família abastada, ele soube como conquistar seu coração: com promessas de estabilidade, uma aura de sofisticação europeia e a capacidade de projetar um futuro próspero. Além de ser um magnata, ele também era um homem que sabia como criar uma narrativa envolvente sobre si mesmo.

Apesar da imagem pública de marido respeitável, sua vida amorosa foi pontuada por infidelidades meticulosamente encobertas. Gulbenkian utilizava sua rede de contatos e seu vasto poder financeiro para manter sigilo sobre suas aventuras. Seus encontros eram discretamente organizados, muitas vezes em viagens "de negócios", em que ele se cercava de aliados leais, que garantiam que nada vazasse para a sociedade londrina ou parisiense. Cartas cifradas, encontros em mansões afastadas e serviços de segurança pessoal garantiam que as escapadas nunca comprometessem sua reputação.

A habilidade de separar sua vida pessoal de sua imagem pública era tão bem orquestrada que, até hoje, poucos detalhes concretos sobre seus relacionamentos extraconjugais vêm à tona. Sua esposa, Nevarte, por mais que suspeitasse, preferia manter as aparências, consciente do peso que a imagem da estabilidade familiar tinha nos círculos financeiros da época.

Um legado de beleza e contradição

Quando finalmente escolheu Lisboa como seu refúgio final, Gulbenkian tinha objetivo claro: criar um espaço onde sua paixão pela arte e pela cultura pudesse prosperar. A Fundação Calouste Gulbenkian não é apenas um museu ou um centro cultural; é o reflexo de um homem que, mesmo deslocado pelo mundo, encontrou uma maneira de construir um legado duradouro.

A ironia de sua história é evidente: um homem sem um lar definitivo deixou um espaço no qual a humanidade pode se refugiar na cultura. Um magnata do petróleo, cuja fortuna veio de uma indústria que destrói paisagens, criou um dos jardins mais belos da Europa. E um homem que soube esconder suas infidelidades deixou um acervo de arte onde a verdade da história e da expressão humana é exposta sem filtros.

Hoje, quem caminha pelos corredores da fundação talvez não imagine as estratégias, os jogos de poder e as paixões ocultas que moldaram a vida de Calouste Gulbenkian, mas, ao admirar suas coleções, está, de alguma forma, tocando um fragmento da mente de um dos mais enigmáticos e influentes homens do século XX.

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José Bonifácio: O patriarca da independência e cientista de renome

Salatiel Soares Correia é engenheiro, administrador de empresas, mestre em Ciência pela Unicamp

Salatiel Soares Correia é engenheiro, administrador de empresas, mestre em Ciência pela Unicamp (Arquivo pessoal)

José Bonifácio de Andrada e Silva nasceu em 13 de junho de 1763, na cidade de Santos, em uma família abastada. Desde cedo, demonstrou grande interesse pelos estudos, recebendo uma educação primorosa em sua cidade natal. Aos 16 anos, em 1779, partiu para Portugal para ingressar na Universidade de Coimbra, uma das mais prestigiadas instituições acadêmicas da época.

Na Universidade de Coimbra, destacou-se nos estudos de Filosofia Natural e Direito. Com grande talento para as ciências naturais, especializou-se em mineralogia, química e metalurgia. Sua inteligência e dedicação lhe garantiram uma sólida reputação, tornando-se professor na própria universidade. Sua contribuição foi tão significativa que sua fama atravessou fronteiras, rendendo-lhe o respeito da comunidade acadêmica europeia. Durante sua permanência na Europa, percorreu vários países, como França, Alemanha e Suécia, aprofundando seus estudos e mantendo contato com importantes cientistas da época.

José Bonifácio fez descobertas relevantes na mineralogia, sendo um dos primeiros cientistas a identificar a petalita, mineral que, anos depois, possibilitaria a descoberta do lítio. Seu trabalho científico contribuiu significativamente para o avanço da geologia e da metalurgia, sendo reconhecido internacionalmente por suas pesquisas.

Após trinta anos na Europa, José Bonifácio retornou ao Brasil em 1819. Sua reputação como cientista e intelectual chamou a atenção da elite política, sendo rapidamente convidado por Dom Pedro I para ocupar cargos públicos de grande relevância. Tornou-se ministro do Reino e dos Negócios Estrangeiros, desempenhando um papel crucial no processo de independência do Brasil. Sua influência foi determinante para a decisão de Dom Pedro I de romper com Portugal, além de ser um dos principais articuladores da unidade territorial do Brasil nascente.

No entanto, suas ideias sobre reformas sociais e a abolição gradual da escravidão o colocaram em confronto com setores conservadores, levando ao seu afastamento da vida política em diversos momentos. José Bonifácio defendia um Brasil soberano e justo, no qual a educação e o desenvolvimento científico desempenhassem um papel central na construção da nação. Exilado algumas vezes, manteve-se fiel a seus ideais, mesmo diante das adversidades. Mais tarde, durante o reinado de Dom Pedro II, sua importância foi reconhecida, mas sua atuação pública não foi retomada com o mesmo vigor.

Mesmo após sua morte, em 1838, sua memória ainda carece de homenagens à altura de sua contribuição para o Brasil. Como cientista, deixou um legado que o tornou conhecido mundialmente, e como estadista, moldou o futuro da nação. Seu nome deveria ser mais celebrado, não apenas por seu papel na independência, mas também por sua visão de um país mais justo e moderno. Embora existam biografias importantes sobre sua vida, como as de Octavio Tarquínio de Sousa e Jorge Caldeira, é necessário um maior esforço para divulgar sua história e ressaltar sua relevância na ciência e na política brasileira.

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Por que Dostoiévski é eterno? Uma análise dos "Irmãos Karamazov"

Modificado em 12/03/2025, 07:30

Fiódor Dostoiévski é, sem dúvida, um dos autores mais reverenciados da literatura mundial, e "Os Irmãos Karamazov" é sua última e mais monumental obra. Mas o que torna Dostoiévski eterno? A resposta encontra-se em sua capacidade única de explorar a complexidade psicológica de seus personagens, na sua habilidade em capturar o leitor por meio de tramas intensas e na profundidade com que aborda os grandes dilemas morais e espirituais da humanidade. Este artigo explora essas qualidades, com ênfase na riqueza psicológica dos três irmãos Karamazov, na habilidade do autor em construir o mistério do parricídio e na razão pela qual esta obra é um patrimônio cultural mundial.

Dostoiévski cria personagens tão profundos que suas contradições e dilemas continuam ressoando através dos séculos. Em "Os Irmãos Karamazov", os três filhos de Fiódor Pavlovitch Karamazov representam, cada um, uma faceta distinta da experiência humana:

  • Dmitri (Mítia): O homem das paixões Dmitri é um personagem dominado por impulsos e paixões. Ele é a personificação do homem carnal, movido por desejos intensos, como o amor, o ciúmes e a sede de justiça. Sua luta interna entre a indulgência e a redenção faz dele uma figura profundamente humana e trágica.
  • Iván: O racionalista atormentado Representando o cético intelectual, Iván é o irmão mais racional e filosófico. Ele desafia as noções de Deus, moralidade e sentido da vida, mas é consumido por um profundo vazio existencial. Seu famoso dilema "Se Deus não existe, tudo é permitido" ainda é amplamente debatido por filósofos e teólogos.
  • Alócha: O idealista espiritual Aliócha é o contraponto aos seus irmãos. Movido por uma fé pura e altruísta, ele simboliza a esperança em meio ao caos. Sua devoção à bondade e ao amor cristão faz dele uma figura quase messiânica, capaz de trazer um vislumbre de redenção aos que o cercam.
  • A interação entre esses três personagens não apenas reflete as tensões internas de cada um, mas também representa os conflitos universais entre razão, emoção e espiritualidade.

    O assassinato de Fiódor Pavlovitch é o motor central da trama, mas Dostoiévski utiliza este crime não apenas como um evento dramático, e sim como um espelho para explorar a condição humana. A indagação sobre quem realmente matou o pai permeia todo o romance, mas o autor não se limita a oferecer uma resposta simples. Ele desafia o leitor a refletir sobre culpabilidade coletiva e moralidade ambígua.

    O mais impressionante é como Dostoiévski conduz o suspense: cada personagem parece, de alguma forma, ligado ao crime. Dmitri, com seu temperamento explosivo e motivações claras, é o suspeito mais óbvio. Iván, por outro lado, parece um mandante moral, incapaz de impedir que suas ideias conduzam a ações terríveis. E Smerdiakov, o serviçal dissimulado, personifica a execução fria e calculista do ato. Essa teia de relações não só amplia a tensão narrativa como também transforma o leitor em um detetive moral, questionando suas próprias convicções.

    "Os Irmãos Karamazov" transcende o tempo e o espaço porque aborda questões universais que continuam relevantes. A obra é um microcosmo da condição humana, explorando temas como o livre-arbítrio, a natureza do mal, a busca por redenção e o sentido da existência. A densidade filosófica e psicológica do romance faz dele uma fonte inesgotável de reflexão e análise.

    Além disso, o impacto cultural da obra é imensurável. Escritores, pensadores e artistas de todo o mundo foram influenciados por Dostoiévski. De Freud a Nietzsche, de Kafka a Camus, suas ideias ecoam em diversas áreas do conhecimento humano. A narrativa densa e envolvente de "Os Irmãos Karamazov" não é apenas uma história; é uma exploração profunda da alma humana.

    Dostoiévski é eterno porque compreendeu como poucos a essência da existência humana. Em "Os Irmãos Karamazov", ele não apenas conta uma história, mas nos convida a confrontar nossas próprias fragilidades, crenças e esperanças. A complexidade psicológica de seus personagens, o mistério habilmente construído e a relevância universal de seus temas fazem dessa obra um verdadeiro patrimônio da cultura mundial. Ler Dostoiévski é um ato de encontro com o que há de mais profundo e eterno em nós mesmos.